Acordos de Não Persecução Penal (ANPP) e sua Aplicação Retroativa: Análise da Decisão do STF (HC 185.913)
- André De Luca
- 20 de set. de 2024
- 3 min de leitura

O Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), introduzido pelo pacote “anticrime” com a Lei nº 13.964/2019, representa um avanço significativo na busca por soluções mais céleres e efetivas no sistema penal brasileiro. O Supremo Tribunal Federal (STF), em recente decisão no HC 185.913, fixou importantes diretrizes sobre a possibilidade de aplicação retroativa do ANPP a processos já em andamento na data de vigência da nova norma. Neste artigo, faremos uma breve contextualização sobre o tema e abordaremos os principais aspectos dessa decisão e suas implicações práticas.
Conforme prevê o artigo 28-A do Código de Processo Penal (CPP), em suma, o Acordo pode ser oferecido pelo Ministério Público ao réu que praticou infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a quatro anos, desde que tenha confessado a conduta.
Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente (...). (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) (Vigência).
Nesse tipo de tratativa, pessoas acusadas de crimes sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos podem ser agraciadas com a benesse, podendo ter extinta a punibilidade do delito, após o cumprimento integral das condições – não gera antecedentes criminais!
Tais mecanismos atrelados à justiça consensual/ negocial, como ANPP, Suspensão Condicional do Processo e Transação Penal, possibilitam mais celeridade e efetividade da Justiça, com reparação do dano e fuga da morosidade judicial.
Com base em dados concretos levantados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), tal decisão acarretará significativa diminuição de processos conclusos em 1ª instância (aproximadamente 1.500,000 processos) e na 2ª instância (em torno de 100.000 processos).
O principal ponto de divergência quanto ao tema residia acerca da (im)possibilidade de aplicação retroativa aos processos em andamento, quando da entrada em vigor da Lei 13.964, de 2019. Pois bem, no dia 18/09/2024, por maioria, após julgamento do HC 185.913, o colegiado fixou a tese proposta pelo relator, ministro Gilmar Mendes:
1- Compete ao membro do MP oficiante, motivadamente e no exercício de seu poder-dever, avaliar o preenchimento dos requisitos para negociação e celebração do ANPP, sem prejuízo do regular exercício dos controles jurisdicional e interno; 2 – É cabível a celebração do ANPP em casos de processos em andamento, quando da entrada da vigência da Lei 13.964/2019, mesmo se ausente confissão do réu até aquele momento, desde que o pedido tenha sido feito antes do trânsito em julgado; 3 – Nos processos penais em andamento na data da proclamação do resultado deste julgamento, nos quais em tese seja cabível a negociação de ANPP, se este ainda não for oferecido ou não houve motivação para o seu não oferecimento, o MP, agindo de ofício, a pedido da defesa ou mediante provocação do magistrado da causa, deverá, na primeira oportunidade que falar nos autos após a publicação da ata deste julgamento, manifestar-se motivadamente acerca do cabimento ou não do acordo; 4 – Nas investigações ou ações penais iniciadas a partir da proclamação do resultado deste julgamento, a proposição de ANPP pelo MP ou a motivação para o seu não oferecimento, devem ser apresentadas antes do recebimento da denúncia, ressalvada a possibilidade de propositura pelo órgão ministerial no curso da ação penal se for o caso.
Portanto, da análise da decisão, extrai-se três hipóteses em que o ANPP poderá ser proposto:
a) a qualquer tempo, desde que antes do trânsito em julgado, para os processos em trâmite antes da vigência da Lei 13.964/2019;
b) na primeira oportunidade, para os processos em andamento, porém, iniciado após a vigência do “Pacote Anticrime”; e
c) antes do recebimento da denúncia, para as investigações e ações penais iniciadas a partir da proclamação do resultado deste julgamento.
Isto posto, na minha opinião, mormente considerando a natureza híbrida da norma (penal e processual), a tese fixada pelo plenário foi acertada, o que possibilitará a aplicação retroativa do ANPP aos casos anteriores à lei “anticrime”, até o trânsito em julgado. De igual forma, a decisão estabeleceu marco temporal preclusivo aos processos em trâmite a partir da Lei 13.964/2019, de modo a impor certo limite, em homenagem aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
Referências
Código de Processo Penal (art. 28-A da Lei nº 13.964/2019)
HC 185.913 - Decisão do STF
Conselho Nacional de Justiça
Dr. André De Luca
Advogado Criminalista